Meu cantinho
- Carolina de Vargas
- 15 de ago. de 2017
- 4 min de leitura
A primeira vez que eu estive lá foi há uns cinco anos... No caminho, várias casas. Mas eu sabia que nenhuma seria aquela em que me diriam para entrar. Como se minha intuição me dissesse "um pouco mais, um pouco mais"... E cheguei. E foi maravilhoso... Naquele dia, naquele lugar, eu descobri um amor que, eu sabia, era meu para sempre. Estava bem no alto, num lugar onde eu podia ver tudo ao redor. Eu via a grama, via as flores, as casas. Via pessoas que eu acabara de conhecer, mas sabia: as queria na minha vida sempre. Olhei para o céu (era tudo o que havia acima de mim) e agradeci a Ele por me permitir estar ali, sentindo tantas coisas novas e incríveis. Agradeci por aqueles braços que me envolviam, porque eu nunca havia me sentido tão segura e feliz e, agradecendo, me senti criando raízes naquele chão em que pisava. Assim, como uma planta recebe água e nutrientes, eu me sentia nutrida de um sentimento inexplicável - uma mistura de conforto, alegria, carinho e coragem para ser quem eu quisesse ser. Acho que nunca me esquecerei da minha própria voz sussurrando um 'eu te amo' pela primeira vez.
Eu voltei quase um ano depois. Dessa vez, pude reparar mais nos detalhes ao meu redor. No papiro, no lago, no pé de amora. O fogão de lenha, o bule azul, o barulho de chuva, o "cheiro de parede". É, eu inventei um termo para esse cheiro que eu só sentia ali e que me trazia tanta paz. De repente, me tornei uma frequentadora assídua. Aquele lugar começou a fazer parte de mim. Eu estava sempre ali, e queria estar cada vez mais. Sabe o que dizem sobre o tempo passar depressa quando você está se divertindo? Pois era exatamente essa a mágica daquele lugar. Lá eu me divertia, eu me sentia verdadeiramente feliz... E o tempo não passava! Eu vivia tanta coisa, mas tanta coisa maravilhosa, dentro de um espaço de tempo tão curto que parecia que estava ali há dias... E ainda parecia pouco.
Com o tempo, passei não somente a frequentar, mas também a "viver" ali. Uso aspas porque, sim, minhas visitas ainda eram esporádicas, mas eu comecei a viver ali momentos tão lindos, tão especiais, tão inesquecíveis que era como se ali dentro eu tivesse mais vida. Como se ali a vida fosse mais bem vivida. Entende o que eu quero dizer? Era sentir que eu pertencia àquele lugar, mesmo que eu jamais esperasse me encontrar ali.
Discreta e involuntariamente, eu fui me construindo ali. Criando hábitos num lugar que não era meu, mas ao qual eu simplesmente pertencia. É possível isso? Eu simplesmente virei parte de um cenário e parecia um sonho se realizando. Virei parte, me fiz parte, dei meu nome àquilo que nunca foi e nunca será meu. "Esse é o cantinho dela", eu ouvi uma vez sobre um lugar no qual eu sempre me sentava. É meu. Meu? Meu.
Estar ali me engrandecia. Eu simplesmente queria viver ali. Mais do que já vivia, mas um viver sempre, viver todos os dias... Queria "vivê-lo em cada vão momento", como já dizia o poeta. Ele dizia sobre o amor. Mas não seria aquele lugar o meu verdadeiro amor? Afinal, já vi ali os meus grandes amores... Amor amante, amor amigo, amor família, amor... eu. Amor eu. Era um lugar que me trazia tanta força, tanta serenidade, que eu simplesmente conseguia me amar mais ainda. Justo, né? Já que foi ali que eu aprendi a amar verdadeiramente. Aprendi a amar amores diferentes... Amores que dependiam de algo que era mais que amor. Aprendi a amar com respeito, com cuidado, com admiração. Aprendi a amar infinito e também a amar só pra mim.
De vez em quando, a vida começa a parecer difícil, né? Parece cinza, parece dura, parece sem amor... A maioria das pessoas busca incessantemente uma solução, um escape para as dificuldades da rotina. Eu não preciso necessariamente buscar. Eu já sei o que fazer para me sentir bem, me sentir cheia de amor. É uma receita fácil: junto pessoas que eu amo, pego a estrada e, algumas entradas à direita depois, é só estacionar. Sai do carro, caminha pra frente, pára um pouquinho. É hora de fechar os olhos, respirar e dizer pra si mesmo "que bom! Estou aqui de novo!". Pronto? Agora segue em frente. Olha pra grama, olha pros bichos, olha pra água. Vê seu reflexo e reflete bem rapidinho se gosta do que vê (do lado de dentro), que a água dali reflete mais que o reflexo - reflete a alma. Olhou? Então sobe o morro, cuidado com uns três ou quatro degraus. Abre a porta, guarda as tralhas, abre a janela e pronto: eu sirvo-me à vontade dessa sensação de pertencer, de amar, de ser amada. Se eu cansar de ficar em pé na janela, é fácil: vou rumo ao meu cantinho, me aconchego ali e descanso o corpo e a alma.
De repente, eu estou bem. Parece que o mundo exterior não consegue chegar ali. Não entra ligação, nem mensagem, nem internet... Que dirá energia ruim, problemas. Ali só entra amor e nos é permitido demonstrá-lo como quisermos. A gente exagera no amor. Mas ali tudo bem. Tudo é bem. Sempre foi e sempre será. A hora de ir embora é uma dorzinha gostosa que arde no fundo do coração. É hora de voltar pra vida, eu sei, mas não ia ser demais se pudéssemos viver só de magia? Posso passar horas divagando sobre o quão incrível seria ficar mais... Mas é hora de ir. Dou uma última olhadinha pra trás e peço ao meu Deus que abençoe aquele lugar, que olhe pra lá com amor e impeça que qualquer mal entre ali.
Faz cinco anos que aquele é o meu lugar preferido no mundo. Cinco anos que eu faço parte daquele lugar, que eu fiz dele o meu cantinho no mundo. Cinco anos... Tão pouco, né? Muitas pessoas estiveram ali antes de mim e estou certa de que muitas outras virão depois de mim. Mas aquele chão em que eu me enraizei sabe que eu estive ali e sabe o quanto eu amei aquele lugar, o quanto eu amei naquele lugar. Acho que nada mais importa.

Comments